sexta-feira, 15 de agosto de 2014

"A ESQUERDA EUROPEIA VISTA DA AMÉRICA LATINA"



Neste período de Campanha Eleitoral, quando acontecimentos de toda ordem, reais e forjadas, além de catástrofes como foi o caso com o candidato Eduardo Campos, até emoções e comoções podem afetar profundamente os resultados das eleições.
Por isso é importante não perder o foco naquilo que vem pela frente, dependendo dos resultados das escolhas que serão feitas.
Apropriar-se da visão do que ocorre dentro de nosso Brasil como aquilo que vai além de suas fronteiras pode fazer muita diferença no futuro de nossas vidas.
O artigo que está sendo postado, de Emir Sader, acrescido de alguns comentários, podem auxiliar a compreensão de como a América Latina vê e avalia a Esquerda Européia e a sua ação.
A visão do mundo que captamos pode nos ajudar a dar forma ao mundo que deveria ser de nosso interesse construir. Esse é o motivo para conferir. Egon Starosky

A ESQUERDA EUROPÉIA VISTA DA AMÉRICA LATINA


"Enquanto a AMÉRICA LATINA resiste à crise e diminui a desigualdade, os governos europeus retrocedem à políticas que foram desastrosas para a AL nos anos 1980 e 1990.


A esquerda latino-americana teve sempre vínculos profundos com a esquerda europeia. Seja pelas referências ideológicas que se recebeu da Europa – anarquismo, socialismo, comunismo -, seja pelo pensadores e suas teorias – Marx e os marxismos, antes de tudo.

Esses vínculos se expressavam também no plano organizativo, com filiação a organizações internacionais, através dos partidos comunistas, social democratas, trotskistas. As temáticas comuns – anti-imperialismo, anticolonialismo, anticapitalismo – também aproximavam as correntes de um lado e de outro do Atlântico.

Houve sempre temas cuja compreensão foi distinta por parte da esquerda de um continente e do outro. Os nacionalismos, em primeiro lugar. Na Europa foram sempre correntes de direita, chauvinistas, enquanto que na América Latina sempre tiveram um tom anti-imperialista, portanto progressista.

Houve um momento preciso em que esses laços sofreram mudanças importantes. Desde o segundo pós guerra a esquerda europeia havia tido sempre atitudes solidárias  com a esquerda latino-americana, propondo alianças políticas.

A virada do governo de François Mitterrand do primeiro para o segundo ano do seu mandato representou uma opção estratégica da social democracia europeia: aliança subordinada com o  bloco liderado pelos EUA e pela Grã Bretanha, ao invés de formar um bloco com os países do Sul do mundo – vítimas principais da globalização neoliberal.

Esta virada foi concomitante com a adoção de variantes do modelo neoliberal pela social democracia europeia, inspirando caminhos similares na América Latina – de forças tradicionalmente nacionalistas, como no México e na Argentina, a outras, de caráter social democrata – como no Chile, na Venezuela, no Brasil, entre outros.

Quando se realizam eleições para o Parlamento europeu, os prenúncios são os piores possíveis para a esquerda europeia. Mas o que causa mais assombro na América Latina é que a mais profunda crise econômica do capitalismo em muitas décadas, não produza grandes mobilizações populares de resistência às politicas de austeridade e o fortalecimento da esquerda, mas, ao contrário, sejam força de extrema direita as que se fortaleçam.

Enquanto que governos latino-americanos resistem à crise e continuam diminuindo a desigualdade e a miséria, valendo-se das próprias experiências keynesianas dos Estados de bem estar social da Europa, os governos europeus retrocedem a políticas que foram desastrosas para a América Latina nos anos 1980 e 1990.

Não é fácil entender, desde a América Latina, como se dá isso. Se vários países do nosso continente têm hoje governos antineoliberais, é porque fizemos uma dura resistência ao neoliberalismo nos anos 1990 e  o derrotamos. Está claro que as condições são distintas, a unificação europeia terminou sendo uma armadilha que dificulta, mas não é menos certo que não haver uma resistência de massas é o cenário de fundo da debilidade da esquerda europeia."

Emir Sader - 26/05/2014

Comentários
José Ricardo Romero - 28/05/2014
Um  fator que precisa ser considerado é que os benefícios das classes trabalhadoras graças à ideologia do bem estar social, foram solapados pela migração indiscriminada de africanos, árabes e orientais ao mercado de trabalho, cujos trabalhadores não apenas inflacionaram o mercado como eles e suas numerosas famílias passaram a gozar de todos os benefícios sociais. Ato contínuo, a união europeia foi estendida aos países do leste europeu sem que estes estivessem minimamente no nível econômico e social dos demais países integrantes, mas seus trabalhadores se juntaram à concorrência do mercado de trabalho e, desta vez, com profissionais de nível superior e bem capacitados. Os governos e partidos de esquerda e os sindicatos e associação de classes que foram os responsáveis para a efetivação da comunidade europeia, a partir de 1982, não tiveram nas décadas seguintes a sensibilidade de equilibrar e gerenciar o conflito entre a solidariedade com outros povos e as necessidades dos seus próprios trabalhadores. Fizeram caridade com o bolso alheio. O resultado foi que a esquerda na Europa perdeu substância ou simplesmente desapareceu. Como em política não existe vácuo, a direita interessada em aumentar o crescimento econômico de suas empresas, naturalmente pequeno devido às obrigações sociais impostas pelas medidas do bem estar social, ocuparam esse espaço com o discurso que os trabalhadores queriam ouvir. A incompetência das esquerdas e sindicatos europeus cavaram o próprio buraco e agora estão sendo enterrados neles pelos próprios europeus que não querem a ideologia do bem estar social para os outros. Enquanto isso o discurso dos ideólogos de esquerda europeus parece um sorvete de massa que se chocou com a testa.

J. Manuel - 27/05/2014
A mi modo de ver las cosas, el aprender de experiencias intelectuales o de las practicas revolucionarias de otras latitudes siempre será una cosa indispensable, el gran problema es que se quieran adoptar a pies juntillas dichas teorías o modelos, eso como dijo Mao Tse Dong, es como cortarse los dedos para que quede el zapato. Por otro lado y lo digo con cierta vergüenza decirlo, creo que existe un vedetismo de intelectuales que son quienes deberían ser la vanguardia no solo ideológica sino también moral y sacrificar el ego en términos de generar actividad intelectual colectiva, creo que esto es valido también para dirigentes políticos que pudiendo incentivar direcciones colectivas defienden su virginidad ególatra para que no sea otro quien se lleve los méritos de la capacidad de convocatoria, es decir hay razones psicológicas y sociológicas entre las causas del atraso de la vanguardia intelectual y política latinoamericana. Finalmente como negar lo obvio?, la propaganda e ideología norteamericana, la actividad nefasta de la CIA y el pentágono con su método infalible digno de capos sicilianos "plomo o plata" tiene su gran contribución al respecto, ahí encontramos también causas de nuestro lumpendesarrollo

Fausto Neves Ribeiro da Silva - 27/05/2014
Victor, a "ilusão de um dia fazer parte da burguesia", por parte dos assalariados e profissionais liberais, mesmo sendo ilusão é algo terrível. Afinal, por síntese de definição, a burguesia é a classe social que detém o poder econômico (capital e meios de produção). Se os governos recentes têm reduzido desigualdades, embora tardiamente, significa uma medida de mais gente na classe média, mas a classe média pré-existente não será empurrada para patamar superior "sem mais nem menos".
Emir, poderia ter se estendido um pouco mais. O Brasil pagou um preço altíssimo pela aventura neoliberal. A privatização dos setores elétrico e de telecomunicação foi algo trágico, embora se possa argumentar que estes setores, quando estatais, dependiam de financiamentos de organismos internacionais e as obras eram superfaturadas. Entretanto, não sei se derrotamos o neoliberalismo. Como um câncer, ele debilita o organismo nacional e, mesmo se controlado, pode voltar de forma agressiva e mortal.
Assim está a Europa. Privatizações em Portugal, Espanha, Grécia, Reino Unido. Carta maior publicou:http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Economia/Governos-usam-crise-para-justificar-nas-privatizacoes-na-Europa/7/27972. Os países da União Europeia começaram a vender os seus activos para diminuir a sua dívida logo no início da crise.
Sugiro também www.bloco.org/transfer/III_Boletim_conferencia.pdf e, newleftreview.org/article/download_pdf?language=pt&id=2739

Victor Emanuel Giglio Ferreira - 26/05/2014
Ótima análise. Porém, parece que deve haver mais algum fator em ação para essa atual fragilidade dos movimentos autênticos de esquerda na Europa e creio que talvez possa estar relacionado ao maior tamanho da classe média, que se deixa envolver com muita facilidade (tal qual no Brasil) pela massiva propaganda neoliberal da gigantesca mídia de direita. Os países da Europa se comportam, até certo ponto, de maneira semelhante ao eleitorado paulista ou paranaense, entre outros, no Brasil. O sujeito classe média que é induzido a manter a ilusão de um dia fazer parte da burguesia. Passa a vida sonhando e falando mal de Cuba e Venezuela, e votando na direita neoliberal, enquanto o grande capital financeiro vai engolindo tudo. Uma grande massa de inocentes úteis, manipulados pela grande mídia. Essa massa ainda é maior na Europa do que na América Latina.

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